Os Grandes Amadores
O programa da RTP "Os Grandes Portugueses" até estava a ser giro. Mas eis que alguém se lembra do seguinte: "E que tal se puséssemos gente completamente incompetente a apresentar os documentários sobre os 10 maiores portugueses?" E assim foi. Confesso que não vi todos os documentários. Para a minha saúde, talvez tenha sido bom não ter visto o que fizeram, por exemplo, com Fernando Pessoa. Mas vi alguns e devo dizer que, em Portugal, o amadorismo continua a ser muito amador. D. Afonso Henriques foi apresentado por uma competentíssima comentadora desportiva. Faz todo o sentido. O nosso primeiro rei foi um desportista muito talentoso, sobretudo a decepar muçulmanos. Mas, na minha opinião, o Maior Amador tem de ser concedido a Gonçalo Cadilhe. "Quem?" - perguntam vocês. Alguém de quem se lembraram que poderia estragar um documentário, usando a parvoíce e essa outra característica que é a parvoíce. Além de abusar na parvoíce, este senhor urdiu um documentário totalmente faccioso. Esqueceu-se das coisas menos boas que o Infante D. Henrique tinha feito e ainda inventou coisas que ele não fizera. Como se não bastasse a parvoíce, conseguiu ainda troçar do estúpido do Camões. O poeta deve ter perdido bastantes noites a inspeccionar dicionários de forma a arranjar um sinónimo para "ilustre" com que apelidar a descendência de D. João I. Por fim, chamou-lhe "ínclita geração", expressão que a História haveria de preservar. Mas estoutro artista, regressando à parvoíce, pensou: "Hmmm... O Camões, além de zarolho, era um bocado burro. Aos filhos de D. João I chamar-lhes-ei, de agora em diante, a "inclita geração". De facto, a diferença não é muita. Isto, claro, se a acentuação das palavras não fosse importante nos versos dos Lusíadas. Além de ter inventado uma palavra nova, Gonçalo Cadilhe, usando de parvoíce, conseguiu ainda estragar o maior poema épico da nossa literatura. E tudo isto num documentário. Bravo...